Os seres humanos evoluíram para além da natureza (precisamos mesmo dela)?

Se hoje alguém vindo de outro planeta perguntasse o que significa ser um “ser humano”, provavelmente obteria definições diferentes. Religiosos, psicólogos, filósofos, cientistas, antropólogos, matemáticos e artistas dariam as mais variadas explicações.

Um artigo que faz parte da série “Life’s Big Questions”, sugere a reflexão acima citando um livro francês intitulado “Les Animaux dénaturés”. Nele, o autor, Jean Bruller, diz que “todos os problemas do homem surgem do fato de que não sabemos o que somos e não concordamos com o que queremos ser”.

O artigo chama-se Have Humans Evolved Beyond Nature—and Do We Even Need It?, o qual também foi publicado no site da Singularity Hub. A tradução do título é o próprio título deste artigo da Glic Fàs, e nossa sugestão é de embarcarmos nessa reflexão.

Como tudo começou

O artigo sugere que existe uma separação gradual de nossa parte – seres humanos – da natureza. O autor, Manuel Berdoy, acredita que muito dificilmente conseguiremos saber o momento dessa separação, mas encontramos pistas nas pinturas rupestres.

“Mas um evento recente importante em nosso relacionamento com o mundo ao nosso redor está tão bem documentado quanto abrupto. Aconteceu numa manhã ensolarada de segunda-feira, às 8:15, exatamente”, escreve.

Berdoy refere-se à bomba atômica que abalou Hiroshima em 6 de agosto de 1945. Esse alerta tão alto que ainda ressoa em nossa consciência muitas décadas depois foi, como ele diz, um chamado para acordarmos.

Naquele dia, o sol nasceu duas vezes e mostrou o quão somos primitivos e paradoxais. Se por um lado tínhamos conhecimentos suficientes que ajudaram a criar a bomba, por outro nos sentimos um Deus regendo as leis do universo. “O Homo sapiens moderno aparentemente desenvolveu os poderes dos deuses, mantendo a psique de um assassino estereotipado da Idade da Pedra”, opina Berdoy.

O medo da natureza havia ficado para trás e a incerteza sobre o que faríamos com nós mesmos tomou conta. Foi então – absolvidos por uma bomba atômica que para nós estava no outro lado do mundo – que passamos a refletir para onde estávamos indo.

Para onde vamos?

A liberdade nos custou, entre tantas outras tragédias que a história conta, a bomba atômica. Mas ela pode nos custar muito além. Se hoje sabemos mais a respeito de nossas origens – apesar de que não existe ainda consenso entre ciência e religião – continuamos sem ter segurança sobre o que queremos ser no futuro (“ou, cada vez mais, à medida que a crise climática se acelera, mesmo se teremos um”).

Nosso domínio sobre a natureza pode ter nos trazido consequências negativas, mas o autor faz uma ressalva: “não estou argumentando contra nosso domínio sobre a natureza nem, mesmo como biólogo, sinto necessidade de preservar o status quo. Grandes mudanças fazem parte da nossa evolução. Afinal, o oxigênio era primeiro um veneno que ameaçava a própria existência do início da vida, mas agora é o combustível vital para a nossa existência”.

Para citar um exemplo, Berdoy segue o pensamento e diz que o argumento contra a engenharia genética, com base em que a mesma é “antinatural”, não o convence . “Ao selecionar artificialmente cepas específicas de trigo ou cães, tínhamos mexido mais ou menos cegamente com os genomas durante séculos antes da revolução genética. Até a nossa escolha de parceiro romântico é uma forma de engenharia genética (…) Até a natureza, ao que parece, pode ser impaciente consigo mesma”.

Mudando nosso mundo

As portas para um outro mundo se abriram quando o campo da genômica passou a vivenciar avanços. Talvez, como escreve o autor, consigamos não explodir o mundo e, em vez disso, mudá-lo (e assim mudarmos a nós mesmos).

“O desenvolvimento de culturas geneticamente modificadas na década de 1980 passou rapidamente de aspirações iniciais para melhorar o sabor dos alimentos para uma maneira mais eficiente de destruir ervas daninhas ou pragas indesejáveis”, explica Berdoy.

Ainda, o autor fala sobre a extinção, citando que não há nada errado em espécies sendo extintas, o que vem acontecendo muito antes de que a raça humano tenha pisado neste planeta. ”Mas é realmente o que queremos?”, pergunta.

Na discussão sobre genética e sobre o surgimento de um homo sapiens genética, Berdoy faz outro questionamento: “se, ou melhor, quando, temos o poder de mudar alguma coisa, o que não mudaríamos? (…) Quando os segredos do universo não estão mais ocultos, o que faz valer a pena fazer parte dele? Onde está a diversão?”

Se a diversão está no nosso valor neste vasto e mutável universo, a resposta é muito simples para o autor. Ele fala sobre empatia e amor.

Verdadeiros deuses

Para Berdoy:

A extensão de nossa capacidade de empatia e amor será o critério pelo qual nossa civilização será julgada. Pode muito bem ser uma referência importante pela qual julgaremos outras civilizações que encontraremos, ou mesmo seremos julgadas por elas”.

Alguns antigos acreditavam que Deus nos criou ‘à sua imagem’. Talvez eles estivessem certos em certo sentido, pois a empatia e o amor são características verdadeiramente divinas, pelo menos entre os deuses benevolentes.

Aprecie essas características e use-as agora, pois mantêm a solução para nosso dilema ético. São esses mesmos atributos que devem nos obrigar a melhorar o bem-estar de nossos semelhantes, sem diminuir a condição do que nos rodeia.

Qualquer coisa menos perverterá (nossa) natureza.

Independentemente de qual seja sua crença, o que Berdoy nos mostra é que apesar de todas as evoluções e todos os avanços, continuamos sendo parte de um todo. E como tal, temos a obrigação de contribuir para a evolução que vai muito além da evolução tecnológica.

Talvez, com todos os acontecimentos que estamos vivendo, esta seja a hora de repensarmos o nosso papel como indivíduos e como sociedade, e buscarmos nos integrar àquilo que nos permite estarmos aqui hoje. Sim, ainda precisamos da natureza.

 

Este artigo contém uma tradução do texto publicado na Singularity Hub e também algumas opiniões. Caso queira ver o artigo original, clique aqui.

Aproveitamos para convidá-lo a interagir conosco: qual sua opinião sobre nossa evolução como seres humanos e nossa relação com a natureza? O que você acha que precisamos hoje para avançarmos em nossa evolução? Deixe um comentário e compartilhe conosco.

Créditos imagem: Pixabay por Mrexentric

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