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Quando criar evidências ficou mais importante que ser ético?

Quando a moda do compliance chegou ao nosso país tivemos uma explosão de projetos estratégicos e de consultorias nas empresas, com pouco questionamento se a própria cultura corporativa já não trazia elementos que dessem sustentação à integridade, à ética ou a qualquer que fosse o jargão do momento. Passados alguns anos, o compliance nas empresas brasileiras ainda está em uma fase embrionária.

O cenário que vemos é o seguinte: nas organizações, a alta administração diz estar engajada aos programas de compliance. Na prática, muitas vezes o discurso não se confirma. Um dos motivos é que para várias empresas a instituição de estruturas de compliance ocorre por necessidade, ou seja, por obrigação (como no caso de uma licitação) e não por convicção.

Mas a partir do momento que a organização precisa de evidências para comprovar sua integridade, será que ela é mesmo íntegra em sua essência? Seguindo o raciocínio, quando passou a ser necessário ter evidências e criar programas caros para ser ético e íntegro? Ou, ainda, quando o tema honestidade saiu da cultura das empresas? Você é nosso convidado para entrar nessa conversa. Boa leitura!

Dizer x fazer: o compliance nas empresas brasileiras

O IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) realizou um estudo inédito para avaliar como anda a adoção do compliance nas empresas brasileiras de capital fechado. A pesquisa contou com 104 respondentes válidos de empresas de diferentes portes (sendo que as PMEs totalizaram uma menor porcentagem da amostra).

O estudo constatou que menos da metade (35,6%) dos respondentes disseram ter uma área de compliance ou um profissional que exerça a função. Outra informação é que em menos de um terço (30,8%) a área é vista como estratégica e com influência sobre as decisões da empresa.

Em um painel promovido pelo IBGC, Sabrina Pezzi, gerente executiva de jurídico e compliance, discute, entre outros temas, o porquê da área de compliance não passar essa visão de estratégia para o restante da organização. Uma das razões é justamente o fato de haver uma dissociação entre discurso e prática por parte da alta administração.

Como ela bem coloca, é a alta administração que funciona como a alavanca do engajamento aos programas de compliance. Para que possamos garantir que a empresa esteja realmente engajada, não basta apenas criar documentos ou estabelecer um canal de denúncias. É preciso assegurar a instalação correta, o bom uso e uma atitude que saia da teoria.

Em outras palavras, muito mais do que adotar um compliance operacional, criando evidências por necessidade, tem a ver com adotar o compliance estratégico.

Compliance operacional x Compliance estratégico

Basicamente, o compliance operacional refere-se a instituir referências de integridade por obrigação. Sendo assim, os processos são traduzidos em uma interação igualmente mais operacional e com o objetivo maior de preencher requisitos. Quando isso ocorre entramos em uma discussão antiga: o que importa é o ato simples ou o ato com o sentimento da boa intenção?

Colocando de uma outra maneira, em muitas organizações brasileiras o compliance só ocorre na prática por uma simples necessidade, e não porque é visto como um programa essencial para proteger todas as partes interessadas do negócio. Como é de se imaginar, nesse caso não temos – e nem precisamos ter – o apoio e o engajamento da alta administração.

Por sua vez o estratégico vai além de meros protocolos aplicados para preencher requisitos e soar bem. Isso porque em uma interação voltada para a estratégia, o compliance faz parte da cultura organizacional e todos o enxergam como algo necessário na tomada de decisão. Além disso, os profissionais de compliance atuam de forma autônoma e independente.

Portanto, perceba que o responsável por trazer essa visão estratégica não é um profissional ou uma área de compliance somente. É muito mais do que isso, pois trata-se de uma missão de toda a empresa, a qual evolui aos poucos com os atributos de confiança, responsabilidade e compromisso institucional.

Por ser um compromisso assumido e colocado pela empresa sem que para isso ela precise ter um motivo (como licitação ou venda), o compliance estratégico está a frente de qualquer interesse. Se pensarmos assim, todas as organizações já deveriam possuir algum tipo de iniciativa para começarem a aplicar um programa de conformidade, concorda?

Como a empresa pode ter um compliance estratégico?

Como comentado, o compliance nas empresas brasileiras está em uma fase embrionária, apesar de que leis como o de anticorrupção terem ajudado a difundir a necessidade de ações de conformidade. Contudo, se existe uma diferença entre operacional e estratégico é porque há quem se preocupe muito mais em apenas apresentar evidências do que em realmente ser ético.

Entenda que a adoção de um compliance estratégico parte da cultura organizacional com o engajamento da alta administração. A partir do momento que o compliance deixa de ser visto como um mal necessário, ele passa a ser uma ferramenta indispensável para a instauração da ética e da integridade, além de uma aliada para a governança corporativa.

Não existe uma receita pronta que se aplique a todos os tipos de negócios. O importante é entender que um programa para ser ético, honesto e íntegro somente fará sentido se a empresa adotar esses pilares porque acredita neles e os coloca em prática em todas as suas ações e interações. Dessa maneira, agindo de modo objetivo.

Por isso, empresas com compliance estratégico não precisam gritar aos quatro ventos o quanto são éticas. Muito mais do que dizer apenas para atrair a atenção, fazer um discurso inflamado ou preencher requisitos, elas realmente incorporam uma atitude ética e íntegra no dia a dia. E assim temos um discurso associado com a prática.

Concluindo

Em outra oportunidade já havíamos abordado que adotar um programa de compliance significa fomentar, no local de trabalho, uma cultura que valorize a integridade e a conduta ética. Se pararmos para pensar nisso, toda empresa deveria, por vontade própria, fomentar esses valores.

O que acontece é que muitas apenas os tornam como partes integrantes de suas culturas quando precisam apresentar evidências, o que nos leva à discussão da diferença entre discurso e prática (ou entre dizer e realmente ser). A honestidade, a integridade e a ética deveriam fazer parte do DNA de qualquer negócio. Quando isso ocorre, o compliance torna-se algo muito mais fácil de ser adotado na rotina organizacional.

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Créditos imagem principal: Pixabay por Andreas Lischka.

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Patricia C. Cucchiarato Sibinelli
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